Hérnias Inguinal e Umbilical: causas, sintomas e tratamento

As hérnias ocorrem quando um órgão ou tecido abdominal protrui através de um ponto fraco da musculatura da parede abdominal. As localizações mais comuns na prática da cirurgia geral são a virilha (hérnia inguinal) e a cicatriz umbilical (hérnia umbilical).

Definição e prevalência

Hérnia inguinal

A hérnia inguinal corresponde a cerca de 75 % de todas as hérnias da parede abdominal. Estima‑se que o risco de desenvolver uma hérnia inguinal ao longo da vida seja de 27 % nos homens e 3 % nas mulheres1. As diretrizes internacionais apontam que mais de 20 milhões de reparos de hérnias inguinais são realizados anualmente em todo o mundo2.

Hérnia umbilical

Nas hérnias umbilicais, o defeito ocorre na cicatriz umbilical. Em adultos, estudos de imagem identificam prevalência entre 10 % e 25 % em populações que nunca foram submetidas a cirurgia abdominal3. Fatores como obesidade, multiparidade e ascite aumentam esse risco.

Fatores de risco

  • Fragilidade ou defeitos congênitos da fáscia (mais comum na cicatriz umbilical).
  • Aumento crônico da pressão intra‑abdominal: tosse crônica, constipação, esforço físico, gravidez, obesidade.
  • Tabagismo e idade avançada, que reduzem a qualidade do colágeno.
  • História familiar de hérnia inguinal; existe componente genético demonstrado4.

Sinais e sintomas

A manifestação típica é a protuberância palpável, associada ou não a desconforto que piora com tosse ou esforço. Dor intensa, náuseas ou impossibilidade de reduzir a hérnia sugerem encarceramento ou estrangulamento — que é uma urgência cirúrgica.

Diagnóstico

O diagnóstico é principalmente clínico. Ultrassonografia pode ser útil em casos duvidosos, sobretudo em pacientes obesos ou com hérnia pequena. A tomografia computadorizada é reservada para grandes defeitos ou dúvidas sobre complicações relacionadas à hérnia.

Tratamento

Quando operar?

  • Hérnias sintomáticas (dor, impacto funcional) devem ser reparadas cirurgicamente25.
  • Hérnias assintomáticas podem ser acompanhadas em pacientes com alto risco cirúrgico; estudos de vigilância ativa demonstram que o watchful waiting é seguro em homens minimamente sintomáticos, com taxa anual de complicação < 1 %, mas cerca de 70 % requerem operação eletiva em sete anos6.
  • O paciente precisa ser informado de que o risco anual de encarceramento/estrangulamento varia de 0,2 % a 2,7 %7.
  • Para hérnias femorais ou hérnias inguinais em mulheres, a cirurgia é recomendada mesmo sem sintomas, pela maior propensão a complicações4.

Técnica operatória

A maioria dos reparos é feita com tela sintética (mesh), seja por via aberta (p. ex., Lichtenstein) ou videolaparoscópica (TAPP/TEP). Ensaios controlados demonstram que o uso de tela reduz a recorrência em até 50 % em comparação com sutura exclusiva8. Em hérnias umbilicais maiores que 1 cm, as diretrizes conjuntas da European e Americas Hernia Societies recomendam fortemente o uso de tela9. Uma meta‑análise recente confirma menor recidiva com tela, sem aumento relevante de dor crônica10. A escolha entre técnica aberta e laparoscópica depende do tamanho do defeito, condição clínica e experiência do cirurgião.

Anestesia

  • Inguinal aberta e umbilical: anestesia local com sedação ou raquianestesia.
  • Inguinal laparoscópica: geralmente anestesia geral.

Complicações se não tratada

O encarceramento impede a redução do conteúdo herniário; o estrangulamento compromete a vascularização, podendo levar à necrose intestinal. Estudos clássicos demonstraram probabilidade acumulada de estrangulamento de 4,5 % em dois anos nas hérnias inguinais não tratadas11. Mesmo que a chance absoluta seja baixa, a mortalidade quando ocorre isquemia intestinal pode superar 7 % em idosos7.

Prognóstico e recuperação

A cirurgia eletiva apresenta mortalidade < 0,1 % e alta no mesmo dia na maioria dos casos. Com a técnica laparoscópica, os pacientes costumam retornar a atividades leves em 7 a 14 dias e são liberados para exercícios vigorosos entre 3 e 4 semanas12. O uso de telas de baixa gramatura e fixação atraumática tem reduzido dor crônica sem aumentar recidiva8.

Prevenção

Manter peso adequado, tratar constipação e cessar tabagismo ajudam a reduzir a pressão intra‑abdominal e a recidiva. Exercícios de fortalecimento do abdome devem ser progressivos e supervisionados.

Conclusão

As hérnias inguinais e umbilicais são frequentes e curáveis. A avaliação individualizada, aliada às diretrizes atualizadas, permite indicar o momento ideal da cirurgia e selecionar a melhor técnica, minimizando complicações e recidivas.

Referências

  1. Kulkarni SR et al. Study of Demographics, Clinical Profile and Risk Factors of Inguinal Hernia. Cureus. 2023. 

  2. HerniaSurge Group et al. International guidelines for groin hernia management. Hernia. 2018.  2

  3. Henriksen NA et al. The prevalence of umbilical hernia in adult surgically naïve patients. J Am Coll Surg. 2022. 

  4. McCarty RL, Baxter KJ. Inguinal hernias: diagnosis and management. Am Fam Physician. 2020.  2

  5. Sociedade Brasileira de Hérnia e Parede Abdominal. Orientações para manejo da hérnia inguinal em adultos. Rev Col Bras Cir. 2019. 

  6. Fitzgibbons RJ et al. Watchful waiting vs repair of inguinal hernia in minimally symptomatic men. JAMA. 2006. 

  7. Kokotovic D et al. Current opinions in inguinal hernia emergencies. Hernia. 2023.  2

  8. Sanders DL et al. A randomized trial of low‑cost mesh in groin hernia repair. N Engl J Med. 2015.  2

  9. European & Americas Hernia Societies. Guidelines for treatment of umbilical and epigastric hernias. Br J Surg. 2020. 

  10. Hajibandeh S et al. Mesh versus suture for elective primary umbilical hernia repair: systematic review and meta‑analysis. 2024. 

  11. Primatesta P, Goldacre MJ. Risk of strangulation in groin hernias. Br J Surg. 1991. 

  12. National Health Service (UK). Recovering from an inguinal hernia repair. 2025. 

Tópicos: